A rodovia que leva de Nova Délhi a Calcutá é a NH2, mas eu sabia que se eu saísse de Nova Delhi pela NH2 eu teria que passar por Agra e enfrentar seu terrível trânsito novamente, então eu decidi evitar Agra e seguir rumo leste, passando por Aligarh pegando a NH2 um pouco mais a frente.
No primeiro dia eu já estava convencido de que isso foi um grande erro, a estrada local estava em péssimas condições, com buracos por toda parte e uma poeira sem fim.
Mas a condição da estrada logo se tornou uma questão secundária, quando eu soube que já estava pedalando no estado em que por toda a Índia as pessoas diziam-me para ter cuidado, e fazendo exatamente o que elas me aconselharam a evitar: pedalar longe da rodovia e à noite.
Ficou, ainda, mais claro que eu teria que ter mais cuidado com essa região quando eu estava em uma lan house e a Polícia, vendo minha bicicleta em frente, entrou no local para falar comigo. Eles foram realmente muito bacanas, reforçando os conselhos sobre segurança e até recomendando que eu evitasse acampar longe de uma delegacia de polícia.
Tenho que dizer que a gentileza da polícia foi além do esperado. Durante essas duas semanas e meia que levei para pedalar de Nova Deli a Calcutá, dormi quase todos os dias em uma delegacia. Já teria sido ótimo se eles me permitissem acampar dentro do complexo, mas para minha surpresa eles sempre me arranjavam uma cama. Tratando-me como "um hóspede da Índia".
Varanasi foi o lugar que eu parei para descansar um pouco, lá dormi três noites em uma Igreja Católica. Conhecida como a capital espiritual da Índia, Varanasi é uma cidade sagrada para os hindus, com muitos peregrinos vindos de todas as partes do país para fazerem suas devoções no rio Ganges, considerado o rio mais sagrado para os hindus.
Eu pensava que era apenas durante o amanhecer, mas, na verdade, durante todo o dia havia pessoas se banhando no rio, um ritual que os hindus acreditam pode perdoar pecados.
O lugar que mais me impressionou foi Manikarnika Ghat, um local de cremação. Acredito que ninguém pode ver um corpo humano queimando sem se impressionar.
Deixando Varanasi levei uma semana para chegar a Calcutá, e quando o fiz também alcancei a marca de 10.000 km pedalados durante esta viagem. Não tenho como não dizer que não fiquei muito contente e orgulhoso com isso, nunca pensei que um dia pedalaria tanto. Nada mau para um principiante!
Essa foi também uma oportunidade para olhar para trás e relembrar o que fiz nestes nove meses, os lugares que já estive, as pessoas que eu conheci e como sou grato por estar vivendo esta experiência.
Esse é o ponto, às vezes você não sabe que será capaz de fazer algo a não ser que se lance e tente. Mas, às vezes, deixamos nossos medos e o conforto do conhecido falarem mais alto e tirar de nós coisas fabulosas que o desconhecido, com seus riscos, tem a oferecer.
Calcutá foi minha última parada na Índia; passei quase uma semana na cidade, ficando em dois lugares diferentes, com anfitriões do CouchSurfing. Ocupado com muitos afazeres, como de costume, mas também descansando e visitando alguns locais.
Impossível falar de Calcutá sem lembrar Madre Teresa. Entre os lugares que visitei na cidade está a Casa Mãe, o lugar onde a Madre Teresa viveu e trabalhou. É a sede das Missionárias da Caridade, a congregação religiosa fundada por ela "para servir os mais pobres dos pobres". De Calcutá se espalhou por todo o mundo, hoje em dia fazendo um trabalho fantástico em mais de 100 países.
Eu pensei que uma vez na Ásia não haveria a necessidade de voar novamente, e eu estaria livre para me mover por terra para qualquer lugar, mas não foi o caso. O meu plano de visitar o Nepal e voltar à Índia não deu certo, pois eu teria que solicitar um outro visto indiano, mas só dois meses após ter deixado a Índia.
Então a opção foi esquecer o Nepal e seguir para o leste. Em Nova Delhi fui à embaixada de Burma solicitar o visto, quando soube que não seria possível entrar ou sair do país por terra. Assim sendo minha única opção para chegar ao Sudeste Asiático seria voando.
E foi assim que a Tailândia, um país que eu não tinha planejado visitar, entrou na minha rota. De lá eu poderei seguir por terra para qualquer direção até o final da minha estada na Ásia.
Então, após três meses e mais de 4.000 km pedalados na Índia, é hora de dizer adeus a esse grande país. E muito obrigado pela experiência incrível, sempre vou me lembrar do tempo que passei aqui, da gentileza e hospitalidade do povo. E sentirei falta até mesmo da bagunça.
Tailândia, aqui vamos nós...